quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

REINO ENCANTADO

 

Já não se ouve mais a voz humana, já não se escuta mais sua busca incessante pela verdade e pela dignidade purificada. O que se ouve é um eco, um som distorcido pela realidade para não mais revelar essências, nem fragrâncias nem poesia. O que se escuta é um som frio e distante do humano, ao que denominamos desumano; um som automático e repetitivo em narrativas incontáveis e torpes. O que se ouve, sem pressa de saber se chegou ou não onde deveria, pois o que importa é ruminar sons ininteligíveis, são ruídos de comunicação com o próprio espelho quebrado. Os sons que se espalham, hoje se perderam por entre suas trincas e fissuras, justamente por não ter propósitos. A palavra foi destituída de raízes e trocou seu conteúdo pelo contexto imaginado. Até a gramática foi vilipendiada, usada como instrumento de demolição de opositores políticos. O certo sou eu quem decide, dizem os desumanizados. Água mole em pedra dura tanto bate até que some, diz a nova realidade. Era uma vez um Reino Encantado do Silêncio, impenetrável para os acéfalos, inviolável pelos batedores de carteirinha, inalcançável para os ruidosos de plantão.

 

 

 


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