segunda-feira, 10 de outubro de 2022

A FERA LÁ FORA

 

Quisera eu ser mais insolúvel e satírico para sobreviver no mundo das feras. Elas estão soltas nas esquinas, trazendo perigo para meus sonhos, espalhadas pelos jornais para denunciar perigo iminente, enferrujadas nas conversas de bar ou entre amigos, travestidas de máscaras singelas na cara dos lobos. Por causa delas, ficamos fechados na casa, cercada de concertinas e câmeras de segurança, deixando de usar o que gostaríamos de nos adornar, temendo estar vivo para que não nos matem na próxima hora escura. Inconscientes de sobreviver numa jaula, pouco a pouco nos transformamos também em feras. Impossibilitados de praticar atos violentos por crenças morais, afiamos a lâmina da língua, envenenamos as palavras que brotam verdes de nossa boca, destruímos reputações, alimentamos pensamentos intolerantes, rasgamos o tecido social e terceirizamos a prática do bem para governos socialistas. Viver no mundo das feras humanas não é tarefa para principiantes amadores.


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