sexta-feira, 20 de abril de 2012

ROLHA DE CORTIÇA


A melhor metáfora que encontrei para descrever a etapa do processo de despertar, no qual me encontro agora, é estar flutuando à deriva como se fosse uma rolha de cortiça, entre o cais e o mar infinito. Vejamos, por partes, os possíveis significados de cada elemento desta metáfora.

A rolha perdeu sua função conhecida de tapar buracos e bocas de garrafa para preservar o conteúdo e os aromas. Ela deixou de trabalhar para segurar o passado, deixou de guardar o conhecimento para necessidades futuras, colocando-se a serviço do momento presente como único instante em que se pode usufruir do aroma da vida. Ela desvalorizou a linha do tempo e eternizou o que havia acima e abaixo desta linha, ou seja, o vazio onde existem as infinitas possibilidades.

Flutuar à deriva é como renunciar ao roteiro de viagem, sem pressa para chegar a lugar algum, sem lugar para visitar, sem apegar-se a nenhuma função. Flutuar feito rolha solta no mar é abrir mão de metas, é desapegar-se de tudo o que antes lhe dava prazer, é descomprometer-se do comando ilusório para experimentar a fluidez da energia vital que se manifesta automaticamente. Estar entre o cais firme e sofredor e a imensidão do mar inquieto é tornar-se indiferente à agitação mental, para ceder lugar a algo maior que chamamos consciência. Só a sensação de deriva elimina a sensação de estranheza. 

Não ter uma função desejada e definida é possibilitar-se útil para qualquer movimento universal da vida. Flutuar à deriva é saber internamente que tudo está perfeitamente correto como acontecimento; é saber que a vida tem autonomia para fluir independentemente das intenções de cada individuo ou cada grupo. Somente as rolhas leves se deixam conduzir pelos movimentos vitais que a cercam de manifestações divinas.

Um comentário:

Unknown disse...

Já alguém me disse que eu era uma rolha de cortiça a flutuar no oceano...como sendo uma acusação...ao que respondi que era uma pedra no fundo do oceano! Apesar de todo oamor que sentia por ele...foi um dos sinais que a relação estava condenada. Adorei o teu texto é assim que sinto e acho que é um sentir positivo...adorei saber que há mais rolhas a flutuar neste imenso oceano! Quem sabe um dia nos cruzemos a meio!