O ato de escrever é um
exercício de transcendência do que se pode viver, interpretar, extrair e
partilhar de um momento acontecido, dentro ou fora de nós. Escrever é recolher
copos de água para montar um poço, um rio, um lago ou um oceano de ideias. A
água é o pensamento nu, ou contorcido, ou multiplicado, ou extasiado, ou
encolhido, ou enfeitado, ou penetrado, ou organizado, ou levado às últimas
consequências.
Escrever é um ato de garimpagem, mas antes de
tudo é trabalho de criação onírica e projeção visual daquilo que nos dá prazer
e denuncia a dor. É alquimia individual das experiências e das carências
humanas. Escrever é dar voz a tudo que existia no mar do silêncio, promovendo
diálogos e monólogos com a essência do que existia sem corpo, por mais
inquietantes ou neutras elas possam parecer. Escrever é tirar a voz das pedras,
da miséria humana, do ignorado, do inconsciente, do inexistente.
O escritor, este
operário da palavra, não conhece a identidade do recipiente, mas revela traços
de sua própria personalidade em sua escrita. Uns procuram a palavra mais
verdadeira, outros, a mais bonita. Uns procuram a alegria, outros o suspense.
Uns procuram o entretenimento, outros o suspiro do coração. Uma coisa todos tem
em comum. Procuram, juntos, o espelho que possa revelar por inteiro a
humanidade, em sua trajetória de vida e de morte. O escritor é este leitor da
própria existência, no ato de transplantar a realidade manifesta para as formas
da palavra, seja no princípio ou no final de um instante que se eterniza para
quem busca o eterno.
Servir-se de um bom
livro é conectar-se com o próximo passo de crescimento pessoal. É alimentar-se
do pudim das ideias. É semeadura de intenções e impetuosidades. É praticar
esportes intelectuais para fortalecer os músculos da inteligência. Ler um bom
livro é reencontrar a esperança na libertação de nossas antiguidades. É tomar
um banho para refrescar os vícios de linguagem adquiridos na rua suja do tempo.
É receber bênçãos de um amigo invisível e recolher o néctar da vida em nossos
voos tímidos. Ler um bom livro é ver-se nele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário