sexta-feira, 24 de abril de 2020

O TEATRO DA VIDA



A atriz termina o espetáculo de teatro. O conteúdo foi recolhido em partes pela audiência, arquivado em gavetas da memória, semeados nos terrenos da mente pensante, criticado ou anulado pelos ignorantes. A atriz nunca deixou de ser ela mesma durante a apresentação, as duas permanecendo no palco, pessoa e personagem. A representada ganhou tanta vida provisória que achou ser real ao apoderar-se do corpo da atriz. Agora eram três no palco, o corpo da pessoa, o corpo da atriz e o corpo da personagem. O público, cada vez mais encantado e emaranhado nas tramas, foi se vendo e se multiplicando no palco, povoando o teatro com seus condicionamentos, crenças, desejos ocultos, vozes caladas, sonhos destruídos, memórias adoráveis, lágrimas reais, filtros anestesiados e movimentos inquietos a ponto de exigir um final feliz. Calados e perplexos, todos saíram do teatro flutuando e sentindo o chão a alguns centímetros dos pés. Quando chegaram em suas casas, fizeram como faz a atriz quando termina o espetáculo. Penduraram-se nos cabides.

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